(Luís Santos, pequeno artigo sobre o livro Agostinho da Silva: Filosofia e Espiritualidade, Educação e Pedagogia)
Agostinho da Silva é um dos precursores da conceção de um Projeto Lusófono que junte países e comunidades, ideia que, de alguma forma, acabou por se materializar em 1996, com a criação da “Comunidade dos Países de Língua Portuguesa” (CPLP). O Professor, porém, não se fica exclusivamente pela língua portuguesa, e como a considera irmã do castelhano, tal como das outras línguas ibéricas, sugere que se parta para a construção de uma confederação ibérica que partilhe objetivos comuns dando, assim, maiores possibilidades ao Projeto.
Para Agostinho, esse referido espírito peninsular medieval ter-se-á reaberto de novo em Portugal no século XX, centrado em dois movimentos simultaneamente complementares e opostos, como terão sido a “Renascença Portuguesa” e a “Seara Nova”, nas suas palavras, “o primeiro, sobre o signo da saudade, o segundo, sobre o signo da ação”.
Por outro lado, segundo ele, a ideia de “sacralização” do mundo que se amplia a partir da Península Ibérica com a Expansão Ultramarina, está bem marcada nalguns autores portugueses, como são, particularmente, os casos de Luís de Camões nos “Lusíadas” e do Padre António Vieira com a sua ideia de “Quinto Império”, ideia esta que é retomada por Fernando Pessoa com renovados contornos.
Como diz Fernando Pessoa, um Império que será o “quinto”, porque fundirá os outros quatro que anteriormente existiram (grego, romano, cristão e europeu), de dimensão mundial e universal, com uma nova religião que sairá do cristianismo, mas que o transcenderá, e que o poeta designa de “Paganismo Superior” ou, para utilizar expressão do nosso autor, de “Politeísmo Supremo”.
Eis, então, a proposta essencial a que Agostinho chega que vai defender e desenvolver vida fora: O Império enaltecido na “Ilha dos Amores” dos Lusíadas, prosseguido por Vieira e por Pessoa, será um império verdadeiramente “católico”, quer dizer, de acordo com a etimologia da palavra, universal, e caracteriza-se pelo advento da Idade do Espírito Santo, o consolador da esperança humana, tal como profetizara o evangelista S. João e idealizou o abade italiano Joaquim di Fiore. Em síntese, o “quinto império”, o império do Espírito Santo, um império de amor e de serviço.
Este Deus consolador que se refere é aquele que Cristo revela, a quem Agostinho reza na igreja, mas que não é o Deus das igrejas, antes o Deus que as une e paira acima de todas. É um Deus a que podemos chegar se atingida a verdade. Um Deus íntegro, total, paradoxal, tudo e nada, imanência e transcendência, que junta tempo e eternidade, sem separação de bem e mal, de homens e animais, de tudo o que existe. Um Deus que é, antes de mais, inefável, e é silêncio, que é alogos e não logos, onde ciência e filosofia, “saudades disfarçadas em raciocínio”, devem ajudar a atingir, mas não podem definir.
Numa fase de maior amadurecimento filosófico Agostinho da Silva, ao “catolicismo” de Vieira e ao “paganismo superior” de Pessoa, vai acrescentar uma dimensão orientalista a que se juntam, de maneira mais evidente, taoismo e budismo que passam a constituir os princípios filosóficos orientadores da desejável fusão ecuménica, sincrética, que dê, de novo, “novos mundos ao mundo”.
Em síntese, uma ideia de religião onde caibam todas as religiões, mas também ateus e agnósticos, desde que à partida saibam aceitar todos os outros como se de si próprios se tratasse; uma ideia de país e de mundo, onde através da educação se possa propor e ajudar a construir na terra um “reino do divino”, ou seja, uma organização social que se caracterize por uma dimensão de serviço do bem comum, onde todos os homens possam velar por todos os homens e não pelo desenrasca de só alguns; afinal, uma ecuménica fraternidade espiritual em templo de paz global que é, ao mesmo tempo, um templo iluminado no interior de cada um.
Luís Santos, docente no Instituto Politécnico de Setúbal