Uma escola que acolhe e integra (II)

Atualmente desenvolvo, no Agrupamento de escolas D. Dinis, Loulé, doravante designado por AEDD, a terceira experiência de gestão escolar.  Estas questões continuam na agenda do dia, uma vez que a democratização do ensino é um processo com múltiplas variáveis de difícil gestão.

Esta região constitui um outlier em termos estatísticos relativamente às variáveis do insucesso e do abandono escolares que, infelizmente, no Algarve registam os piores scores do país. A minha escola é, no que diz respeito ao comportamento destas variáveis, um exemplo concreto de como não podemos confundir massificação do ensino com a sua democratização. De facto, podemos constatar que a organização escolar, que engloba todos os elementos que envolvem o trabalho pedagógico, está presa a modelos tradicionais hierarquizados onde muita vezes impera uma organização de pendor taylorista muito centrada no paradigma industrial. Ora, esta forma de organização que concebe a educação como algo externo à escola merece a nossa inquietação pelas seguintes ordens de razões:

– A primeira, por se centrar na emergência de concebermos o currículo, na sua organização e no seu desenvolvimento, não como uma construção externa à escola, mas antes como um conhecimento escolar sendo objeto ele próprio, de produção no contexto da escola. Esta dimensão do conhecimento curricular não dispensa o currículo nacional; pelo contrário, ele é necessário, mas só ganha o seu significado intrínseco na relação da escola com o seu interland social e cultural. É pedida a organização e o desenvolvimento curricular, em articulação com as entidades locais que possuem potencial educativo e que tem sido uma das alavancas do Plano de Inovação Pedagógica que estamos atualmente a desenvolver no AEDD. Nesse sentido, a necessidade de co- construir o currículo escolar é um processo que desenvolvemos em parceria com as autoridades locais de educação, com as próprias entidades comunitárias, dando espaço à produção do currículo no contexto da escola e à concretização do seu próprio projeto político pedagógico, porque educar não é clonar.

– A segunda razão decorre da primeira e relaciona-se com a falta de interesse na escola que não atinge de modo igual as diferentes classes sociais em presença, uma vez que há classes sociais cuja cultura familiar está muito mais identificada com a cultura escolar, do que outras classes sociais onde a dificuldade em dar sentido à presença dos alunos e ao seu desempenho escolar é mais evidente. Portanto, quanto menos sentido tiver a escola, muito maior é a probabilidade do insucesso e do abandono escolar. Esta falta de interesse, plasmada no interesse, plasmada no comportamento das variáveis anteriormente referidas, tem também alguma ressonância na lentidão relacionada coma  a capacidade de mudar o modo como é feita a aprendizagem nas nossas escolas.

Esta organização pedagógica pensada de maneira homogénea, muito pouco diferenciadas, tem merecido a nossa atenção, no sentido da criação de novas disciplinas, no desenvolvimento do trabalho de projeto, na aposta no trabalho colaborativo entre os professores de diferentes disciplinas, alterando a gramática escolar de homogeneização do ensino, conferindo maior autonomia aos professores da escola, valorizando o lúdico e o cívico.

PEDAGÓGICA 2030: PROJETO SIC (SUCESSO, INCLUSÃO E CIDADANIA).

Na composição da nossa população escolar, cerca de 1/3 dos nossos alunos são oriundos de fluxos migratórios, sendo que metade desse quantitativo é de nacionalidade brasileira e o restante de uma assinalável profusão de diferentes nacionalidades, cerca de 40 na sua totalidade.

O Plano de Inovação do AEDD, denominado Pedagogia 2023, tem elevado as expetativas dos diferentes atores escolares. Todavia, os 14 anos de experiência enquanto gestor escolar habituaram-me a viver, quotidianamente, a tensão e contradições existentes entre o “dito e o feito”, isto é, entre os planos e a realidade concreta da concretização das suas metas, permitindo-me ter uma intuição diferente da realidade, A natureza do nosso plano de inovação, com o esforço de precisão da ação que antecipa, é muito importante para guiar o nosso trabalho. Todavia, estamos conscientes que a política de inovação se realiza, não no plano propriamente dito, mas na sua execução concreta, na escola e na ação dos seus atores. Assim, o desafio que o plano em si propõe ás nossas escolas é o de acolhimento das pessoas que há nos alunos, ajudando-as, pessoal e autonomamente, a tomar conta dos seus próprios destinos, tratando-as não como alunos, mas como seres com potencial de crescimento, de aprendizagem e de humanismo. Nesse sentido, estaremos a conferir uma nova dimensão para as nossas escolas, assente na concretização das metas de um sucesso escolar mais pleno, de uma maior e mais profícua inclusão e de uma cidadania exercida quotidianamente no ato de educar e de aprender.

 

(In JL 8-21 de fevereiro de 2023)

Cortesia de Manuel Nora – Diretor do Agrupamento de Escolas D. Dinis, em Loulé. Licenciado em Geografia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e mestre em Ciências da Educação, tem o curso de Formação Avançada que integra o programa de Doutoramento em Ciências de Educação, na especialidade de Administração Educacional.

Partilhar

Comments are closed.

Subscreva o nosso Boletim!

Subscribe our newsletter!