No ritmo frenético da vida moderna, a constante interação com o ambiente externo muitas vezes nos aprisiona em padrões e rotinas, obscurecendo nossa capacidade inata de gerar o novo. **Como encontrar soluções verdadeiramente originais em meio ao ruído incessante?** Para que a criatividade floresça, é crucial desviar o foco da agitação externa e voltar-se para o silêncio interior — um espaço fértil, onde sementes de ideias inexploradas podem germinar. Uma mente sobrecarregada, como um recipiente cheio, não comporta mais líquido: precisa ser esvaziada para acolher o novo.
Uma antiga história zen ilustra essa necessidade de desapego mental:
Durante uma longa jornada, um Mestre Zen e seu jovem discípulo caminhavam por trilhas isoladas. Em certo ponto, encontraram uma mulher à beira de um rio turbulento, incapaz de atravessá-lo.
Sem hesitar, o Mestre, apesar de seus votos de não tocar mulheres, carregou- a nos braços através da correnteza e a depositou em segurança na outra margem. Silenciosamente, seguiram seu caminho pela floresta.
Horas depois, ainda inquieto, o discípulo questionou:
- Mestre, como pôde carregar aquela mulher? Violamos nossos votos! O Mestre sorriu e respondeu:
- Eu a deixei na margem do Você ainda a está carregando.
Nossos pensamentos moldam nossas ações**, mas quando nos apegamos excessivamente a eles, perdemos a capacidade de perceber o espaço entre um pensamento e outro — espaço este que é a verdadeira fonte da criatividade. Precisamos acessar essa lacuna silenciosa para desbloquear nosso potencial interno.
Acessando a Fonte Oculta: Mergulhando no Silêncio Interior
Em situações desafiadoras, o corpo instintivamente ativa o sistema nervoso simpático — útil para sobrevivência imediata, mas prejudicial quando acionado cronicamente pelo estresse cotidiano. O cérebro opera, então, em dois modos básicos: processamento de informações externas (atenção referente ao objeto) e sobrevivência.
Embora necessários, esses modos não bastam para o florescimento do nosso potencial mais elevado. A mente humana guarda uma capacidade notável: **a de observar seu próprio funcionamento**.
Ao fecharmos os olhos, a mente começa a se aquietar; pensamentos e sentimentos tornam-se mais perceptíveis. Porém, mesmo essa introspecção inicial ainda processa conteúdo. Para além disso, existe a possibilidade de acessar um estado de **atenção plena sem conteúdo**, um puro alerta além do tempo e do espaço. Esse estado opera em **modo autorreferente**, conectando-nos à nossa inteligência intrínseca.
Cultivar esse estado transforma profundamente o cérebro, permitindo que o potencial criativo ilimitado se manifeste em nossas ações. Tornamo-nos mais proativos e menos reativos, assim como uma **semente oca**, que guarda, silenciosamente, toda a potência de uma floresta.
A Busca Interior: Desvendando a Fonte da Vida
Será possível encontrar verdadeira felicidade apenas no mundo externo? A busca incessante por conquistas materiais, embora compreensível, frequentemente gera insatisfação. A verdadeira realização reside no silêncio interior, conectando a mente à sua fonte — o Ser.
Einstein dizia que a verdade habita o silêncio, esse campo de potencialidade invisível que, como os espaços entre as notas musicais, dá sentido à melodia da vida.
Ao mergulharmos nas camadas da mente, desvelamos um estado de serenidade profunda, a fonte silenciosa dos pensamentos. Diferentes frequências cerebrais ilustram essa jornada interior:
- Ondas beta e gama associam-se à atenção referente ao
- Ondas teta, ao processamento
- coerência de Ondas alfa 1, à atenção autorreferente e ao estado de transcendência.
No modo autorreferente, a coerência das ondas alfa 1 proporciona a experiência de alerta sem conteúdo — a consciência transcendental — onde a mente repousa em si mesma, suportada pela fisiologia.
Maharishi Mahesh Yogi, ao trazer a técnica da **Meditação Transcendental**, resgatou esse conhecimento do antigo Veda: a consciência, embora transcenda o cérebro, usa-o como instrumento de expressão. Assim como as ondas contêm a essência do oceano, os diferentes níveis de consciência — sono, sonho, vigília e transcendência — se manifestam em padrões fisiológicos distintos.
A transcendência corresponde ao estado de **Turiya**, a consciência além do tempo e espaço, caracterizada pela coerência das ondas alfa e ativação do córtex pré-frontal.
Transcender é como puxar o arco antes de soltar a flecha:** mergulhar no silêncio para agir depois com mais potência, criatividade e precisão. É nesse vazio fecundo — como a semente oca — que surgem insights e soluções inovadoras.
Reconectando-se à Fonte: Um Caminho para a Plenitude
Como ser menos vulnerável às circunstâncias externas?
Ao nos conectarmos com a fonte interior, tornamo-nos menos suscetíveis às flutuações do ambiente e mais autorreferentes, enraizados em nossa própria natureza.
Ser autorreferente não é ser egocêntrico: é expandir a consciência de modo a incluir tudo e todos. A mente, quando mergulha no silêncio, atua como uma semente criativa, de onde emergem ideias, soluções e ações mais sutis e eficazes — verdadeiros frutos de uma consciência expandida.
A prática da Meditação Transcendental facilita esse mergulho, proporcionando descanso profundo, clareza mental e reativando o potencial adormecido dentro de cada um de nós.
Conclusão
A criatividade e a realização plena não são encontradas na correria do mundo externo, mas na reconexão com a fonte silenciosa de onde brotam todos os pensamentos. Transcendendo as limitações da mente condicionada, tornamo- nos canais para o extraordinário.
Que cada um de nós tenha a coragem de voltar-se para dentro, ouvir o silêncio fértil da própria consciência e agir a partir dele. Nesse espaço além do tempo e das palavras, descobrimos o poder de criar, de recomeçar — e de viver plenamente.
Valeria Portugal, DSc.